Este trabalho analisa a evolução das exportações e importações brasileiras entre os anos de 2008 e 2017, com foco nos combustíveis derivados de petróleo (diesel, gasolina, querosene etc.), motivado pela recente paralisação dos caminhoneiros em decorrência da alta dos preços desses produtos.

Utilizando dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) das exportações e importações brasileiras, analisa-se a evolução do saldo da balança comercial do Brasil. Com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), observa-se superávit na balança comercial de petróleo bruto déficit no de derivados. Houve queda de processamento de petróleo nas refinarias brasileiras, a despeito do crescimento da produção de petróleo nacional. O mercado interno de combustíveis é dependente de importações de óleo do exterior, visto que o petróleo brasileiro não tem as características adequadas para a produção de gasolina.

Este trabalho está dividido em quatro seções, sendo esta introdução a primeira. A segunda seção apresenta um panorama geral da balança comercial brasileira desde 1997, com uma breve análise dos períodos de superávit e déficit, os principais países com que o Brasil faz comércio e o grau de abertura comercial brasileiro. A terceira seção analisa o mercado doméstico de combustíveis derivados do petróleo. A quarta e última seção compreende as conclusões do estudo, com sugestões para futuras pesquisas sobre a balança comercial brasileira e a dependência do país no petróleo importado.

Panorama geral do Comércio Exterior brasileiro

Saldo da Balança Comercial

O Brasil, desde a abertura comercial no começo da década de 1990, avançou bastante quanto à abertura ao comércio com outros países. O Gráfico 1 mostra a evolução anual das exportações e importações brasileiras em valores free-on-board (FOB) em dólares e o saldo.

A partir do ano 2001 observou-se um grande crescimento do volume de importações e exportações brasileiras, acumulando contínuos superávits até 2013. Nesse período de 13 anos, o superávit acumulado foi de 326,6 bilhões de reais. Em 2009, devido à crise financeira nos Estados Unidos, o comércio exterior teve uma queda acentuada, mas se recuperou rapidamente no ano seguinte. Do final de 2002 a meados de 2011 viu-se uma grande valorização da taxa de câmbio brasileira, com uma breve interrupção apenas durante a crise financeira.

De julho de 2011 a outubro de 2018 o real desvalorizou em relação ao dólar cerca de 58%, reduzindo o poder de compra dos brasileiros em relação à oferta externa. Como muitos produtos produzidos no Brasil contém elementos vindos de outros países, a forte alta do dólar teve impacto na inflação e no custo das empresas.

Principais países

A Tabela 1 apresenta os dados da balança comercial brasileira em relação aos dez países com maior corrente de comércio em 2017. A China é, atualmente, o maior parceiro de comércio exterior do Brasil, seguido dos Estados Unidos, Argentina, Alemanha, Países Baixos, Japão, Chile, Coréia do Sul e Índia.

Chama atenção o impressionante aumento das exportações brasileiras para a China (187,5%) e para a Índia (322,7%), revertendo um cenário de déficit em 2008 para superávit em 2017. O comércio com os Países Baixos apresenta superávit constante e significativo ao longo do tempo, apesar de ter havido queda das exportações e aumento das importações nesse período. A balança comercial com a Alemanha, por outro lado, traz déficits consistentemente para o Brasil.

O Chile, que assinou acordo de livre comércio com o Brasil1 em novembro de 2018, dobrou o saldo positivo na balança comercial brasileiro, de 0,8 bilhões de dólares, para 1,6 bilhões de dólares entre 2008 e 2017.

Abertura Comercial

Apesar do avanço na abertura comercial, o Brasil ainda é um país muito fechado. O grau de abertura de um país é calculado pela razão entre a soma das exportações e importações pelo seu Produto Interno Bruto  —  PIB (CARVALHO, 2002 apud BRUM; DIDOLICH, 2009), ou seja:

$$GA=\frac{X+M}{PIB}$$

Onde: \(X\) e \(M\) representam os valores de exportações e importações, respectivamente, e \(GA\) é o grau de abertura comercial do país.

O Gráfico 2 mostra um ranking de grau de abertura comercial de 45 países calculado a partir de dados do Banco Mundial (2018).

Para a construção desse ranking foram escolhidos os países que atendiam a três critérios:

  • Área territorial maior do que 100 mil quilômetros quadrados;
  • Média dos últimos 10 anos da população maior do que 10 milhões de pessoas; e
  • Média dos últimos 10 anos do PIB em dólares, a valores constantes de 2010, maior do que US$ 50 bilhões.

Para o cálculo foram usados os dados de exportação, importação e PIB nas moedas locais dos países. Por fim, o grau de abertura no Gráfico 2 é uma média dos valores obtidos para os anos de 2008 a 2017. O grau de abertura do Brasil no ano de 2017 foi de aproximadamente 25% do PIB, posicionando o país entre os mais fechados do mundo.

O baixo grau de abertura comercial do Brasil é explicado pelos altos impostos de importação e pelas barreiras não-tarifárias que dificultam e encarecem a entrada de produtos demandados por empresas e pessoas do país. Muitos economistas defendem que o país precisa avançar na integração comercial com o resto do mundo, pois além de baixar os custos de insumos e produtos importados, também aumentaria as exportações e melhoraria a eficiência da economia brasileira. Para isso acontecer, é preciso “uma política de requalificação centralizada nos trabalhadores afetados temporariamente pela liberalização, tendo em consideração fatores geográficos, estruturais, curriculares e orçamentários para sua implementação.” (BRASIL, 2018, p. 7).

Balança Comercial de Petróleo e Derivados

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP, 2018) publica estatísticas da balança comercial de petróleo e seus derivados mensalmente em seu site. Segundo esses dados, o Brasil tem significativo superávit na importação e exportação de petróleo bruto (Gráfico 3).

Por outro lado, o resultado da balança comercial de derivados de petróleo apresenta déficit em magnitude quase igual ao de petróleo bruto (Gráfico 4), anulando grande parte do saldo positivo da conta de petróleo e derivados.

A partir de 2016 o saldo da balança comercial de petróleo de derivados passou a ser positivo (IBP, 2018) em mais de 2 bilhões de dólares anuais, principalmente pela queda das importações de petróleo bruto. Nos anos de 2009 e 2010, o Brasil teve saldo positivo mas em valores bem menores (592 milhões e 271 milhões de dólares respectivamente).

A explicação para o superávit do petróleo bruto e déficit dos derivados de petróleo é o tipo e a qualidade do petróleo produzido no Brasil e o déficit na capacidade instalada de refino do óleo. O Nexo Jornal (2018) explica:

O Brasil é o nono maior produtor de petróleo do mundo, segundo dados de 2017 da EIA (U.S. Energy Information Administration, agência de informações energéticas do governo americano). Mas isso não quer dizer que o país não dependa do mercado externo. São dois os motivos principais.O primeiro é que parte do petróleo extraído no Brasil é considerado pesado, difícil e caro para o refino que produz combustíveis. Isso significa que o país vende parte de seu petróleo para fora e compra o petróleo mais apropriado para o refino do exterior.Além disso, o país não tem capacidade instalada suficiente para a produção de todo o combustível de que necessita — e precisa comprar uma pequena parte já pronta de outros países. (NEXO JORNAL, 2018).

O Brasil é altamente dependente do petróleo do mercado externo e, portanto, o preço internacional do petróleo afeta diretamente o custo da gasolina, diesel e outros produtos derivados do óleo. A paralisação dos caminhoneiros que ocorreu em maio de 2018 foi motivada, segundo os líderes do movimento, pela alta do preço do óleo diesel (BBC BRASIL, 2018).

Preço do petróleo e derivados

A mudança na política de preços da Petrobras, principal empresa do setor, de reajustes diários nas refinarias, que aumentou a volatilidade dos preços, é outra crítica manifestada pelos apoiadores da paralisação dos caminhoneiros. De fato, o preço do litro da gasolina e do diesel teve vários reajustes desde o anúncio dessa nova política.

Com o objetivo de refletir o preço do petróleo no mercado internacional, os preços dos combustíveis vendidos pelas refinarias da Petrobras são reajustados sempre que for necessário. O represamento dos preços da gasolina durante o primeiro governo Dilma (2011–2014), que causou prejuízos bilionários à empresa foi um dos motivos para a mudança na política de preços da empresa (MORAES, 2018).

Entre 2011 e final de 2014 o preço médio do barril de petróleo bruto esteve em patamares bastante elevados (Gráfico 5). A taxa de câmbio, vale lembrar, se desvalorizou nesse período, como mostrado no Gráfico 1b, o que contribuiu para elevar o preço do petróleo mesmo em momentos de relativa estabilidade dos preços internacionais. No entanto, houve poucos ajustes nos preços dos combustíveis pela Petrobras, geralmente abaixo do aumento do preço do petróleo em moeda local.

De fato, o preço real da gasolina vem caindo desde o início da década de 2000 (NEXO JORNAL, 2017). A forte alta dos preços recentemente (Gráfico 6), e sua excessiva oscilação nos postos de gasolina, entretanto, foi visto negativamente pela sociedade. Para amenizar as oscilações de curto-prazo poderia ser adotado um mecanismo de suavização de preços para diminuir a volatilidade e os riscos/incertezas percebidos pelos agentes econômicos em relação aos preços dos combustíveis (COADY, 2012).

Produção e processamento de petróleo

A produção de petróleo brasileiro está em crescimento desde 2000, e não aparenta estar desacelerando (Gráfico 6). No primeiro trimestre de 2000, a produção foi de 3,8 milhões de barris equivalentes de petróleo (bep), e no terceiro trimestre de 2018 a produção ultrapassou os 142 milhões de bep.

Por outro lado, o processamento de petróleo nas refinarias apresenta tendência de queda a partir do último trimestre de 2014. Os processamentos de petróleo nacional e importado tiveram queda de -13,4% e -52,4%, respectivamente, no último trimestre de 2018 em relação ao último trimestre de 2014, representando um decréscimo somado de -38,2 bilhões de bep processados.

A produção dos produtos derivados de petróleo nas refinarias brasileiras também teve significativa queda a partir de 2015 (Gráfico 7). A produção de óleo diesel sofreu a maior variação negativa. A gasolina automotiva (GASOLINA A) também teve queda de produção, mas em volume absoluto menor do que o do diesel.

A Petrobras está executando um plano de venda de ativos (desinvestimentos) que inclui a venda de refinarias2 e isso pode ter impactado a produção e processamento de petróleo e derivados no Brasil. A redução de produção de derivados de petróleo pode estar relacionada ao aumento da ociosidade das refinarias em operação no país.

Conclusão

No ano de 2017 o país registrou um recorde histórico de superávit na balança comercial, com saldo positivo de 67 bilhões de dólares. Todavia, o Brasil ainda é uma economia bastante fechada em relação ao resto do mundo. Uma política bem planejada de abertura comercial poderia ajudar na crônica estagnação da produtividade brasileira e aumentar a competitividade da indústria brasileira, bem como levar a uma redução dos preços dos bens em geral para a sociedade.

A oferta de gasolina e óleo diesel no mercado doméstico é bastante dependente do comércio internacional, pois o petróleo produzido no país não é adequado para a produção desses combustíveis. O represamento dos preços dos combustíveis, num período de alta dos preços internacionais do petróleo, pela Petrobras entre 2011 e 2014 causou prejuízos bilionários à empresa. A política de preços adotada pelo governo Temer, para corrigir esse problema, levou a uma grande volatilidade dos preços para os consumidores. Isso, mais a rápida alta recente dos preços da gasolina e óleo diesel, motivou a paralisação dos caminhoneiros em maio de 2018.

Por último, neste trabalho, observou-se que o plano de desinvestimentos da Petrobras pode estar relacionado com a redução do processamento de petróleo nas refinarias do país e queda da produção interna de gasolina, óleo diesel e outros derivados de petróleo.

Sugere-se que futuros estudos sobre o tema abordem a estrutura de mercado de refino de petróleo e distribuição de combustíveis no país. O número de refinarias no Brasil é considerado baixo para a demanda existente e um aumento de empresas no setor poderia fortalecer o fornecimento de gasolina e diesel para as indústrias e a população em geral.


Notas de rodapé:

1 O acordo de livre comércio (ALC) assinado pelos países, segundo o MDIC, “expande, atualiza e moderniza acordo comercial prévio, de 1996, responsável por eliminar tarifas de importação no intercâmbio bilateral de bens”. (BRASIL, 2018).

2 Ver CartaCapital (2018).


Referências

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